segunda-feira, 9 de junho de 2008

Confissão

O que foi escrito até aqui esconde algo que mudou em mim, visceralmente, desde que vim morar em Blumenau. Esta cidade trouxe à tona uma face feia, reprovável e pecadora da minha personalidade. Eu nunca imaginei que isso fosse acontecer. Mas as circunstâncias me forçaram. E ao mesmo tempo que a mudança transformou minha vida para melhor na maioria dos aspectos, o inferno passou a habitar a minha casa, sorrateiramente, ao despertar esse meu instinto.
Eu desconhecia a minha capacidade de eliminação fria. Porque quando estou pronta para, mais uma vez, fazer sucumbir aquele ser à minha frente, me despojo de qualquer noção de piedade, reprovação. Sou apenas eu e ele. E eu escolho o melhor momento e a melhor forma. É sempre quando meus filhos e meu marido não estão. Eles não precisam saber o que faço. Quando eles chegam, à noite, na mesa de jantar, continuo agindo como se nada tivesse acontecido.
É claro que isso martela na minha cabeça o dia inteiro. Como esquecer quantos já eliminei, e variando o método, que é o que mais me delicia... Balanço entre o pesar por fazer o que faço e a certeza de que ninguém, lá do buraco de onde vieram, sentirá falta deles. Eles são tão insignificantes que se um ou outro chorar, não vai fazer diferença neste mundo onde quem manda é gente como eu.
Será que eu tenho o direito? Como às vezes acho que não, e mais do que isso, não suportaria o julgamento de gente que ainda acredita que o mundo é perfeito, disfarço e não dou a menor pista do que preenche as minhas tardes, quando adentro elegante na escola dos meus filhos, com os dois levados por mim, a matriarca exemplar. As outras mães me cumprimentam e nem sonham quem sou eu na verdade.
Os que passam em frente à minha casa burguesa não imaginam que aqui vive uma assassina. Apenas alguém que fosse um pouco mais atento notaria a principal pista. Das duas trepadeiras que ornam a entrada, apenas uma está inteira. A outra sofre o ataque dos infelizes que passo a vida eliminando. É nisso que Blumenau me transformou. Numa assassina de uma bando de formigas fdp que não param de comer minhas plantas.

3 comentários:

euclydes de almeida disse...

Suas observações mostram que compreendeste a nossa cultura multifacetada,as belezas naturais e a amabilidade do povo catarinense.Felizmente moras numa região que tem imensa liderança sobre o nosso Brasil.Teus olhos multi raciais viram as matas ciliares do Itajaí Açu,a formosura dessas frescas serras e o manso caminhar desses ribeiros.Tudo isso pintado com esse linguajar e a beleza desse povo que a etnia de fora nos concedeu.Escreva mais,gostei do seu blog.Abração Euclydes dfe Almeida

Unknown disse...

Fantástico!

J.Valpereiro disse...

Nil seu texto me comove, seu sempre fã Zé Valpereiro