quarta-feira, 28 de maio de 2008

A bunda

“Queix mem’ cons’rtar o p’nal?”
Tico e Teco ficaram alguns milésimos de segundo paralisados antes de começar a trabalhar na minha cabeça. A sorte é que eu tinha comprado a lista de materiais da criançada no começo do ano e lá estava escrito “1 penal”, que depois entendi ser um estojo. Penal é o nome que eles dão aqui. Nome bonito, antigo, poético. Enfim, concordei em consertar o zíper estragado do recipiente para colocar penas, digo, lápis e canetas.
Além do significado de algumas palavras o sotaque do povo blumenauense ainda não é 100% familiar aos meus ouvidos e custo a escandir algumas frases... Passo pela segunda vez na vida por este processo. A primeira foi quando fui morar por seis anos em Juiz de Fora e custei a me acostumar a ouvir “acadimia”, “tumate” e “fugão”, além de descobrir que "envém" era vem: “Lá envém o ônibus!”. Mas assim como aconteceu em Minas, estou adorando tudo isso.
Em sua maioria, as pessoas em Blumenau têm um acento bem parecido com o português de Portugal, chiam como os cariocas, e usam de forma mais poética ainda o tu. Fora o queres, que vira “queix”, é bem bonito ouvir nos supermercados “tens cartão?” e nas lojas “posso pegar, se tu quiseres”. A musicalidade também é curiosa. Os finais de frase são sempre em tom crescente, de uma forma que nós, no Sudeste, só fazemos quando queremos dar ênfase ao que se diz. A frase mais banal, como “ele é grande”, é dita de forma super afirmativa - “ele é grandeeeee” - então a coisa deixa de ser grande e fica enorme! E isso, quase sempre em ritmo acelerado, porque mais uma vez como nossos irmãos lusitanos, aqui se fala bem depressa.
O emprego de algumas palavras me parece ser diferente por causa da tradução direta do alemão. Uma pessoa, ao telefone, não fala “vou aí (onde você está)”, e sim “vou ali”, o que pra mim é estranho, já que ali não é aqui (onde eu estou). Apesar de não falar alemão, se não estou errada, a palavra Da em alemão serve para aí e ali, como o there em inglês. “Vou pedir pra ele” pode significar também “vou perguntar”, o que me parece mais um traço de influência germânica, como se fosse o ask, do inglês.
Me senti mais em casa quando vi que quase todo mundo fala “meu”, exatamente do modo como os paulistas. E é quase todo mundo mesmo, até os mais velhinhos: “Meeeeu!”. O “Cuida!” é a expressão para “Cuidado!”. Este a minha filha já aprendeu. E ela também já solta “podes” e “queres” de vez em quando...
Existe ainda uma palavra multifuncional, cabalística e coringa: lavação. Aqui não existe área de serviço. É lavação. Nem você deixa a roupa na lavanderia pra lavar e passar. É na lavação. Quer deixar o carro limpinho? Aqui não tem lava-rápido. É lavação.
No entanto, foi com um sentimento libertador que descobri que “bunda” por esses lados não tem um sentido tão pejorativo. Sempre procurei, principalmente com meus filhos, falar bumbum porque bunda era mais pesado, afinal. Mas aqui se fala bunda com uma naturalidade incrível! Fiquei feliz por não ter que esconder tanto a bunda em Blumenau.

3 comentários:

Ana Elisa Faria disse...

Ei, Nilmaaaa!
Vi a indicação do seu blog lá no msn e cá estou.
Ah, adorei! Muito legal ler suas impressoões de Blumenau.

beijão,
Ana.

Unknown disse...

Nilma, minha Mána mais nova, Adorei ler você aqui. E gostei de saber que bunda é uma coisa legal e normal por ai. Como deveria mesmo ser em todos os lados e formatos...rs
E vamos fazer a lavação, lavação, lavação, do que deve ser lavado, ser lavado, ser lavado!!! Beijos.

nilbea disse...

Finalmente vou poder falar BUNDA com a Beatriz sem ninguém me encher o saco! Wonderful!!!